Transtorno do espectro do autismo (TEA)

Escalas (instrumentos) que ajudam no diagnóstico do TEA:

Modified Checklist for Autism in Toddles (M-CHAT): trata-se do instrumento de triagem (isto é, seleção de casos suspeitos de TEA) mais estudado e amplamente utilizado para no mundo. Foi elaborado para ser aplicado em crianças com idade entre 16 e 36 meses, de fácil aplicação, não exigindo um treinamento específico por parte do profissional, podendo ser utilizado dentro da rotina de uma consulta pediátrica. Uma versão modificada e revisada foi elaborada, vindo acompanhada de perguntas de natureza mais explicativa, trata-se da M-CHAT-R/F. Crianças que obtiverem pontuação maior ou igual a 8 apresentam alto risco de serem diagnosticadas com TEA ou outro transtorno de desenvolvimento, devendo o quanto antes serem submetidas a uma avaliação especializada para confirmação do diagnóstico e implementação das intervenções precoces. As crianças rastreadas com o M-CHAT-R / F são identificadas com TEA em idades mais jovens do que o previsto pelas estatísticas nacionais nos Estados Unidos.

Em um outro tipo de avaliação, instrumentos específicos (escalas) são utilizados para a identificação dos sintomas com ênfase no diagnóstico propriamente dito. Os instrumentos/entrevistas estruturadas foram elaboradas para se seguir um padrão e sequência bem definidos de perguntas direcionadas a determinados sintomas ou comportamentos durante a avaliação. A avaliação é completada por informações, presentes no histórico do paciente, ou dados que tenham importância para o diagnóstico. Esses instrumentos são de grande utilidade na identificação de sintomas, tendo como objetivo o preenchimento ou não dos critérios específicos para o diagnóstico de acordo com os critérios estabelecidos por determinados manuais. Como exemplo, os critérios de diagnóstico para o transtorno do espectro autista presentes no DSM-5. Entre esses instrumentos, destacam-se:

Childhood Autism Rating Scale – CARS (Escala de Pontuação para Autismo Infantil): a CARS é um instrumento de avaliação composto por 15 itens, abordando sintomas e sinais que podem ser identificados pela observação direta da criança e/ou coletados através de entrevistas realizadas com os pais ou cuidadores. As condutas e reações da criança, durante as consultas são observadas e medidas em cada uma das quinze áreas com sete níveis diferentes de pontuação que compõem o instrumento. Os escores de cada item variam de um (comportamento dentro dos limites da normalidade) a quatro (comportamento severamente anormal para a idade). Ao final, é obtido um escore total que além de fornecer o diagnóstico, classifica a gravidade da sintomatologia avaliada de acordo com os seguintes níveis: normal, autismo leve/moderado, autismo grave. A CARS é uma escala que utilizamos, com frequência, na nossa prática clínica. A sua 1a versão pode ser aplicada em crianças e em adolescentes do Brasil e foi validada para o nosso meio por Pereira (Pereira e cols., 2008). Uma 2a versão revisada e atualizada já está sendo utilizada em outros países (CARS-2), porém ainda não foi validada no Brasil, não podendo ser utilizada oficialmente em populações brasileiras.

Autism Diagnostic Interview – Revised (ADI-R): entrevista semiestruturada para ser aplicada com os pais ou cuidadores, com as perguntas dirigidas aos padrões iniciais de desenvolvimento da comunicação, interação social, jogo e padrões restritos de interesses e de comportamentos. É um instrumento de formato longo, exigindo treinamento intensivo e especializado por parte do profissional que o utiliza, de aplicação demorada (em torno de 90 a 120 minutos), tornando-o de difícil uso na prática clínica quando considerada a nossa realidade. Nos centros de excelência é utilizado dentro de um protocolo específico para avaliação do TEA. É um instrumento de grande precisão diagnóstica, muito utilizado em ambiente de pesquisa, embora possa ser utilizado na prática clínica, por profissionais bem treinados e familiarizados com sua aplicação, sendo de grande valor na confirmação do diagnóstico. O ADI-R fornece uma sequência de regras e procedimentos tendo, como base, os critérios de diagnóstico para autismo utilizados no DSM-IV (antecessor do DSM-V). No Brasil, em um estudo publicado pela revista Arquivos de Neuropsiquiatria em 2012, o ADI-R foi traduzido e validado por Becker e cols. para crianças e adolescentes brasileiros, com idades entre sete e dezoito anos. Segundo os autores, os resultados indicaram que a versão final do ADI-R apresentou boas propriedades psicométricas preliminares em relação à validação na população estudada.

Autism Diagnostic Observation Schedule (ADOS): é um instrumento semiestruturado, no qual o profissional observa padrões de interação social, comunicação, jogo e uso imaginativo de materiais em crianças e adolescentes com suspeita de TEA. O protocolo do instrumento consiste em quatro módulos de observação de 30 minutos, desenvolvidos para serem administrados de acordo com o nível de linguagem da criança ou do adolescente. A sensibilidade e a especificidade (link 9) para autismo e o transtorno invasivo do desenvolvimento sem outra especificação quando comparados a outros transtornos que não façam parte do espectro do autismo é excelente, embora a diferenciação de autismo para autismo atípico seja moderada. Em sua primeira versão, a ADOS foi elaborada de acordo com os critérios do DSM-IV, por isso a utilização dos termos “autismo” e “autismo atípico”. É um instrumento que exige treinamento técnico e intensivo por parte do profissional, levando 30 a 40 minutos para sua aplicação. Em sua 2a versão, a Autism Diagnostic Observation Schedule (ADOS-2), foi elaborada de acordo com os critérios do DSM-5. É complementada com informações do histórico do paciente, considerando-se dados da interação social, comprometimento nas diversas áreas funcionais (interação com colegas, relações sociais e comprometimento funcional) e já utiliza o termo transtorno do espectro do autismo, nomenclatura mais atual.

Nenhum desses dois instrumentos (ADI-R e ADOS-2), utilizados isoladamente, apresenta uma precisão de 100% em relação ao diagnóstico, mas são utilizados como suporte para confirmação do diagnóstico de acordo com os critérios do DSM-5. O ADI-R e o ADOS-2 podem ser utilizados como instrumento de pesquisa e de avaliação clínica. Quando são utilizados em contextos direcionados exclusivamente para avaliação clínica, obtêm-se uma menor eficácia diagnóstica, no entanto, não impedindo a sua utilização, levando-se em conta a experiência do profissional que os aplica.

Manuais de Diagnóstico: nos manuais, podem ser encontrados os chamados “critérios de diagnósticos” que, quando preenchidos, estabelecem a confirmação do diagnóstico final. No Brasil, como manual oficial de diagnóstico, é utilizada a Classificação Internacional de Doenças (CID-10) em sua 10ª edição, elaborada pela Organização Mundial de Saúde (OMS). Há uma previsão da nova versão, a CID-11, ser oficialmente utilizada em 2022, como manual de diagnóstico e de pesquisa, não só no Brasil, mas no mundo (com interesse particular para aqueles países que a utilizam oficialmente), a nova versão do manual substituirá a antiga CID-10.
Outro manual de diagnóstico, reconhecido e utilizado mundialmente, tanto como instrumento de pesquisa quanto manual oficial de diagnóstico em alguns países (entre eles, os Estados Unidos), é o Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais, em sua 5ª. Edição (DSM-5) elaborado pela Associação Americana de Psiquiatria. No Brasil, pode ser utilizado como instrumento de pesquisa, referência para complementação teórica na elaboração de laudos periciais, pareceres psiquiátricos expedidos para diversos fins, mas nunca para expedição única de diagnóstico em qualquer documento de caráter oficial na área de saúde.

Sensibilidade: capacidade de um instrumento em reconhecer os casos verdadeiros positivos, isto é, os casos com o diagnóstico preciso e firmado.

Especificidade: capacidade de um instrumento de reconhecer os casos verdadeiros negativos.

Observação: Um instrumento teria validade perfeita se selecionasse todos os casos positivos (isto é, com diagnóstico confirmado e não suspeito de uma determinada população), sendo 100% sensível e não incluísse, entre os casos suspeitos, nenhum sadio (100% específico). Entretanto, esses aspectos são independentes e com algum grau de imperfeição, dependendo muito do tipo de estudo e da população que se pretende investigar.

FONTES:
Bandim, JM. Autismo.Uma Abordagem Prática (2a edição). Recife: Edições Bagaço, 2011, pp. 47-60. https://www.

Beacham C, Reid M, Bradshaw J, Lambha M, Evans L, Gillespie S, et al. Screening for Autism Spectrum Disorder: Profiles of Children who Are Missed. J Dev Behav Pediatr. 2018; 39(9): 673-82.

Becker MM, Wagner MB, Bosa, Schmidt C, Longo D, Papaléo C, Riesgo RS. Translation and validation of Autism Diagnostic Interview-Revised (ADI-R) for autism diagnosis in Brazil. Arq Neuropsiquiatr. 2012:70 (3):185- 190.

Dawkins T, Meyer AT, Van Bourgondien ME. The relationship between the Childhood Autism Rating Scale: Second Edition and clinical diagnosis utilizing the DSM-IV-TR and the DSM-5. J Autism Dev Disord. 2016; 46(10):3361–3368.

Hyman SL, Levy SE, Myers SM, AAP COUNCIL ON CHILDREN WITH DISABILITIES, SECTION ON DEVELOPMENTAL AND BEHAVIORAL PEDIATRICS. Identification, Evaluation, and Management of Children with Autism Spectrum Disorder. Pediatrics. 2020;145(1): e2019344.

Lai, K.Y.C., Yuen, E.C.W., Hung, S.F. et al. Autism Diagnostic Interview-Revised Within DSM-5 Framework: Test of Reliability and Validity in Chinese Children. J Autism Dev Disord. 2021. https://doi.org/10.1007/s10803-021-05079-5.

Lord C, Luyster R, Gotham K, Guthrie W. Autism Diagnostic Observation Schedule, Second Edition (ADOS-2) Manual (Part II): Toddler Module. Torrance, CA: Western Psychological Services, 2012.

Lord C, Rutter M, DiLavore PC, Risi S, Gotham K, Bishop SL. Autism Diagnostic Observation Schedule, Second Edition (ADOS-2) Manual (Part 1): Modules 1-4. Torrance, CA: Western Psychological Services, 2012.

Lord C, Rutter M, Le Couteur A. Autism Diagnostic Interview-Revised: a revised version of a diagnostic interview for caregivers of individuals with possible pervasive developmental disorders. J Autism Dev Disord. 1994; 24 (5): 659–685.


Exames complementares:

  • Teste do pezinho (chamado de triagem neonatal): um dos mais importantes, realizado com o bebê entre três e cinco dias de vida. Pode identificar precocemente algumas doenças associadas ao TEA ou/e deficiência intelectual;
  • Testes sorológicos: identificação de infecções como toxoplasmose congênita, rubéola congênita, citomegalovírus, os quais podem ser feitos durante a gestação;
  • Testes genéticos: mesmo dependendo do caso, não há um consenso no Brasil sobre a necessidade da solicitação de alguns desses testes mesmo pelos geneticistas. Os testes genéticos mais sofisticados são de alto custo, o que os torna fora da realidade da maioria da população brasileira, salvo se houvesse cobertura financeira por órgãos governamentais;.
  • Avaliação da função auditiva: pode ser realizada por um otorrinolaringologista ou fonoaudiólogo, quando se pretende uma investigação de caráter mais diagnóstico ou fonoaudiólogo, com o objetivo de se identificar ou não déficits auditivos. Entre os exames específicos solicitados destacamos o BERA.
  • Eletroencefalograma (EEG): solicitado quando se suspeita do diagnóstico de epilepsia (uma das condições clínicas mais associadas ao TEA) ou outras doenças que possam ser identificadas por alterações no EEG (como algumas condições de natureza degenerativa);
  • Ressonância Magnética de crânio: solicitada para a identificação de possíveis alterações observadas no sistema nervoso cent